segunda-feira, 16 de março de 2020

Série Povos Indígenas - Shawãdawa (Araras)

Shawãdawa - o povo Arara

    Com uma população aproximada de 677 (2014) essa etnia indígena situa-se na região do Alto Juruá no estado do Acre, dividindo-se entre duas principais reservas indígenas, TI Arara – Igarapé Humaitá e Jaminawa-Arara – Rio Bagé, a primeira homologada em fins dos anos 80 e a outra em meados dos anos noventa tendo sido publicada no diário oficial da união apenas em 2001 e a portaria declaratória do Ministro da Justiça para que seja de posse permanente dos índios apenas em 2002.
    São conhecidos por Arara, nome dado pela frente de expansão do Alto Juruá no século XIX quando se fez o contato de brancos com essa etnia, eles se auto denominam como Shawãdawa podendo ser referidos também como “Shawanáwa”, “Xawanáua”, “Xawanáwa”, “Chauã-nau”, “Ararapina”, “Ararawa”, “Araranás”, “Ararauás” e “Tachinauás”, desde o contato até a homologação de suas terras foram um povo quase nômade fugindo dos seringais e também das muitas guerras intertribais no início do século XX, o que deu a eles uma alcunha de tribo guerreira, porém de lá pra cá muitas coisas mudaram e os Arara se adaptaram “aos novos tempos”, alterando um pouco sua organização, inclusive a organização social deixaram de viver em grandes malocas para viverem em pequenas casas próximas cada núcleo familiar
     Sua língua materna quase foi perdida, mas em função do resgate histórico da revalorização da
TI - Arara - Igarapé Humaita
identidade indígena e dos “antigos” seu idioma foi preservado e aos poucos vem se expandindo dentro do grupo. Como muitas outras etnias próximas a matriz linguística é o Pano, a região do Alto Juruá sempre foi (desde tempos imemoriais) dominada por grupos de matriz Pano e Aruak.
     Hoje em dia o acesso as aldeias se dá quase que exclusivamente por via fluvial, mas trilhas pela
floresta ligam uma comunidade a outra, algumas cidades Acreanas estão próximas de seu território, Cruzeiro do sul, segunda maior cidade do estado e Porto Valter teem maior relevância, Cruzeiro do Sul ainda hoje conta com muitos Araras residentes e integrados aos sistemas municipais e Porto Valter, por ser a mais próxima municipalidade, é onde a maioria dos araras comercializam seus produtos, além de terem conflitos de interesse por regiões de caça, já que, muitos caçadores de Porto Valter invadem as terras indígenas atrás de caça para consumo e comercialização. Como muitas outras etnias os Shawãdawa comercializam com as cidades produtos orgânicos, em especial a farinha de macaxeira, e compram itens de primeira necessidade como açúcar, sal, pólvora, etc. ainda hoje a caça, a coleta e o “roçado” são parte fundamental da sua cultura.
Curadores e guardiões
das medicinas Shawãdawa
     No universo das “medicinas” tradicionalmente, desde tempos imemoriais, esse grupo faz uso da “injeção do sapo” (Kambo) e o “simbu” (ou Timbu, Ayahuasca), praticam também o “Mariri” uma forma de dança ritualística que serve para alegrar a população e manter a unidade social, momento também em que os mais velhos, aqueles que dominam a língua matriz podem passar seu ensinamento tradicional, como em outros exemplos o “Campô” ou a vacina do sapo é indicada para aqueles com falta de sorte na caça, preguiça, fraqueza, etc., o “Timbu” usado mais frequentemente por “pajés” serve para aprender e curar, através do canto e da encantaria, já o rapé está mais associado aos rituais de caça e força para o dia a dia, além dessas medicinas eles praticam a defumação para limpeza energética, em tempos remotos, antes do contato, o uso das medicinas era mais comum entre a população no geral, hoje seu uso é mais restrito mas nota-se um crescente interesse por parte dos mais jovens em retomar essas tradições “...isso é desde o começo do mundo. A vacina do sapo é bom para quem está com cansaço na perna, para a pessoa engordar, para a pessoa matar caça, é muito bom. Para dor de cabeça é muito bom. A pessoa que dorme muito, toma aquela vacina do sapo, passa. Eu tomei muita vacina de sapo(João Martins, 10/03/2000, Cruzeiro do Sul)”
músicos shawãdawa ao pé da Samaúma
     Os indivíduos desse grupo se reconhecem como Araras (os animais alados) comparando-os a si no quesito de viverem em comunidades de fazerem a “zoada” (algazarra) e serem descendentes desse animal, antigamente dizia-se não ter diferença entre homem e bicho e cada bicho teve uma descendência ligada a cada uma das etnias indígenas, o mito de criação Shawãdawa varia de contador para contador mas De maneira bastante resumida, os principais elementos desse mito são os que seguem: existia uma maloca com diversas crianças, e próximo ao roçado um pé de Sumaúma, onde morava um gavião. Quase todos os dias esse gavião saía para caçar e trazia alimentos para o seu filhote. Quando a caça começou a acabar ele passou a pegar as crianças indígenas. Comeu todas as crianças menos uma.
   Nesse momento um “caboclo” da aldeia resolveu matar o gavião, antes dele “acabar” com os índios. Quando ele conseguiu matar o gavião, após muita dificuldade, tendo construído uma escada para chegar ao ninho, colocou penas dentro de um cesto. Em uma noite esse cesto começou a fazer um barulho, que o “caboclo” pensou serem baratas comendo as penas. No dia seguinte, pela manhã, ele abriu o cesto e não tinha baratas, só as penas. Após várias noites escutando o barulho, e no dia seguinte pela manhã conferindo o cesto e não encontrando o que fazia o barulho, um dia ao repetir a ação do cesto saíram cantando de felicidade todas as tribos Pano, cada uma dizendo o seu nome, Shawãdawa, Yawanawa, Kaxinawa, Xaranawa, Duwanawa, Poyanawa e outras. Esse mito é corroborado por outras etnias de maneira bem similar dando uma origem comum a todos os povos de língua pano e trazendo uma certa unidade parental imemorial.